Em 2019, o filme sul-coreano Parasita foi lançado e após muitas críticas positivas e prêmios pelo mundo, conseguiu um fato inédito, o Oscar de melhor filme (e mais três estatuetas), o primeiro do país. Esse foi o divisor de águas para que começasse a se valorizar mais filmes de outras etnias, para que se olhasse mais para cultura do outro lado do mundo. Como descendente de japoneses e apoiadora da maior difusão da cultura asiática, tive orgulho em 2020 quando o filme ganhou as 4 categorias em que estava concorrendo, além da Palma de Ouro e do BAFTA.
E agora, em 2022, tenho o mesmo sentimento e muita empolgação de estar na torcida pelo Oscar de melhor filme ou melhor roteiro adaptado para "Drive my car", filme japonês de Ryusuke Hamaguchi adaptado do conto de mesmo nome de Haruki Murakami, do livro "Homens sem mulheres" (2015).
O conto não é extenso, ele narra o dilema de Yusuke Kafuku, que após se tornar viúvo precisa conviver com uma dúvida deixada com ele após a morte de sua mulher. Sem amigos e focado no trabalho, ele encontra na motorista Misaki uma pessoa com quem pudesse dividir o que sentia, simplesmente pelo fato dela deixá-lo extremamente confortável enquanto dirigia. Isso é um resumo do conto! Mas, vamos falar sobre o filme?
Filme: Drive my car
Oto e Kafuku | (Imagens de divulgação) |
Fui convidada para uma cabine, onde jornalistas, imprensa e influenciadores assistem antecipadamente a uma sessão do filme antes da estreia para ajudar em sua divulgação fazendo críticas ou indicações.
Foram 3 horas de filme, segundo o representante da O2 Filmes a distribuidora do longa aqui no Brasil, ainda poderiam haver modificações na versão que vai aos cinemas a partir do dia 17 de março, e que estará disponível na plataforma MUBI em 1º de abril.
Posso dividir a história do filme em 3 partes, já que estamos falando de uma adaptação de um conto para um filme. A primeira parte nos mostra a relação de Kafuku com Oto, sua esposa. O dia a dia do casal pode parecer monótono no começo, deixando as coisas meio paradas. Mas, a intenção é mostrar exatamente a rotina de dois adultos na casa dos 40 anos, com uma relação de trabalho e de convivência estáveis, o que não deixa margem para pensar nas ações de Oto.
Kafuku trabalha como ator, enquanto Oto deixou de ser atriz para ser roteirista. A peça que ele está encenando é Tio Vânia, de Tchekhov - clássico da literatura russa, e sim meu nome é comum de dois. O drama da peça de teatro acaba de alguma forma se misturando com o drama da vida de Kafuku, que porventura torna-se sendo regada pela culpa. Quando Oto tenta pedir um tempo de Kafuku para ter uma conversa importante sobre algo, ele chega tarde tentando evitar este encontro e se depara com a esposa inconsciente, e é aí que a "primeira parte" do filme fecha.
Após dois anos da morte de Oto, ele é chamado para dirigir a mesma peça que estava encenando quando Oto falecera, mas na cidade de Hiroshima. Por questões éticas do grupo de teatro, é designado a Kafuku uma motorista. Seu automóvel um Saab 900 é uma de suas paixões, porém, como também é diagnosticado com um problema na vista, ele acaba por aceitar Misaki - uma jovem na casa dos 20 anos - para o cargo.
Kafuku (Hidetoshi Nishijima) | (Imagens de divulgação) |
A "segunda parte" trabalha a construção do elenco e da preparação dos atores para encenar a peça, e é aí a parte mais linda da adaptação, são atores que falam diferentes línguas e seguem o método das falas decoradas fielmente para interpretar o drama. O que Kafuku não espera é se encontrar com uma peça em comum com seu passado com Oto, que traz à tona a angústia deixada por sua mulher mais forte.
Não há muito diálogo entre ele e Misaki durante esta parte do filme, mas conforme ela dirige, ele acaba tendo mais curiosidade ainda sobre quem é esta pessoa, enquanto a mesma começa a acompanhar de perto a vida amargurada deste diretor.
A fotografia do filme também muda bastante, enquanto a primeira parte se passa em Tóquio, a segunda mostra lindas panorâmicas de Hiroshima - que também é lembrada com menções ao Memorial da Paz, já que foi uma das duas cidades bombardeadas na Segunda Guerra Mundial.
Misaki e Kafuku dentro do Saab 900 | (Imagem de divulgação) |
Na "terceira parte", Kafuku começa a se abrir mais sobre o que aconteceu em seu passado e encara de frente o homem com quem tem pontas soltas, numa tentativa de adivinhar as ações de Oto. E seguindo o enredo, Misaki dá abertura sobre sua vida à Kafuku após presenciar certas confissões dentro do carro e, sua história serve de consolo para ele, de alguma maneira. Quando Kafuku, finalmente, olha para a trajetória da garota, os dois descobrem sentimentos em comum: culpa e o ressentimento.
É aqui que o ponto de tensão acontece, e Kafuku precisa tomar uma decisão após uma reviravolta antes da estreia de sua peça. E seu pedido para Misaki é conhecer o lugar de onde ela vem, em Hokkaido, no extremo norte do país.
Conduzido por ela em seu Saab 900 e com dias ininterruptos de viagem, os dois se consolam no percurso, e é no passado de Misaki que Kafuku entende o que fazer com tudo aquilo que sente.
O roteiro é bem do estilo que eu gosto, profundo e que não deixa você tirar os olhos da tela. Não é algo dinâmico e nem de longe tem qualquer efeito espetacular, mas a riqueza de cada personagem é muito bem construída!
Indico o filme para todos que gostam de uma boa história e fico na torcida para que o Brasil goste e abrace mais o cinema asiático.
Ficaram interessados na resenha? Depois me contem se assistiram! Mostrei um pouco de como foi a cabine no meu Instagram @vsusaki, aproveita e já me segue por lá!